Última Cidade | A realidade brasileira pelo olhar do sci-fi

Usando elementos visuais da ficção científica e com uma narrativa que lembra as grandes jornadas do faroeste Última Cidade apresenta dramas e problemas comuns para a população mais carente, além de deixar claro quem são os responsáveis por esse ciclo de abuso.

Com camponês João, que precisa ir até a cidade para resolver uma questão envolvendo a terra onde ele mora, o filme mostra bem o dilema entre rural e urbano que muitas pessoas acabam vivendo, mesmo que contra a sua vontade.

Fica claro desde o início que João tem pouco, ou nenhum, conhecimento sobre seus direitos, o que faz com que seja um alvo fácil para ser moldado e usado dependendo das necessidades de grandes corporações. E mesmo que outras pessoas tentem avisar ele dos perigos que estão a frente, ele continua seu caminho, por acreditar que sua vontade e honestidade serão suficientes para garantir justiça.

O drama de João é comum, não apenas para a população rural, como para as pessoas que estão em situação mais vulneráveis nos centros urbanos. Com a expansão imobiliária de alto nível, com prédios novos e modernos ganhando cada vez mais espaço, muitas vezes esquecemos que no lugar de um condomínio antes existiam diversas casas e famílias. E seus destinos também são esquecidos pelo poder público.

Foto: Divulgação

Mas além dessa camada mais clara de crítica o filme também aborda o conceito do cyberpunk muito bem. Sendo uma divisão distópica dentro da ficção científica, o cyberpunk tem como principal característica a tecnologia super desenvolvida e um padrão de vida muito baixo, e para diversos teóricos sobre o tema já estamos vivendo esse momento.

Usando várias sequências com telas de LED, ou pedaços de lixo tecnológico compondo o cenário, fica clara essa provocação que a obra tem na hora de discutir os impactos que a desapropriação de terras por grandes companhias também acaba tendo no cotidiano das cidades.

Contudo, por apresentar tantos elementos e camadas diferentes para a jornada de João, a sensação final é que esses temas não foram tão aprofundados quanto seria possível. O que é uma pena, já que suas críticas podem acabar passando batido para olhares menos treinados, ou que foquem apenas na parte visual.

Já que o filme é belíssimo, a experiência de ver ele se torna ainda mais impactante, e muitas cenas poderiam ser estudadas e comentadas de tão bem compostas que elas são. Tudo isso torna Última Cidade, sem dúvida, uma excelente adição para a lista de filmes surrealistas que temos visto despontar nos últimos anos.


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